O que ando a ler
Estas duas últimas semanas foram pesadinhas, pois, a seguir ao calor, ao barulho e ao movimento da Feira do Livro de Lisboa (que este ano incluiu um enfarte em directo, mas o autor que o sofreu já está fora de perigo, graças a Deus), veio o planeamento dos livros de 2023 e os orçamentos, com contas para cada livro previsto, o que cansa qualquer cabeça nascida para as letras. Talvez por isso não fui capaz de entusiasmar-me por aí além com o livro que trago em mãos, do vencedor do Prémio Nobel da Literatura nascido em Zanzibar (mas a residir há muito em Inglaterra), Abdulrazak Gurnah. Trata-se de Paraíso e é, de certa forma, também um romance de formação, na medida em que relata a vida de um adolescente na companhia de um comerciante a quem foi entregue pelo pai em pagamento de uma dívida. Maltratado pelos capatazes, protegido pelo comerciante, muito belo e cobiçado por homens e mulheres, está sempre no fio da navalha e prestes a ser vítima de abuso. Primeiro a trabalhar numa loja e a mimar um jardim, depois numa grande viagem comercial pelo interior de África, o jovem Yusuf conhecerá tribos hostis, dissensões religiosas, atitudes violentas e primárias, costumes estranhos e mosquitos capazes de matar; e lembrar-se-á cada vez menos do rosto da mãe, que chorou ao vê-lo partir de casa aos doze anos. Escrito com delicadeza, mas talvez um nadinha arrastado, este romance foi finalista do Booker Prize em 1994 e tornou conhecido o seu autor no Reino Unido e não só.