O que ando a ler
Leio menos ensaio do que gostaria, mas, por deformação profissional, estou treinada sobretudo para ler ficção, encontrar autores, perceber o que está a mudar na arte de contar histórias. Porém, agora leio um ensaio maravilhoso, que já comprei há muito e estava lá por casa à espera de uma brecha. Soube que um colega o andava a ler e o seu entusiasmo pegou-se-me; então, mal terminei o romance que tinha em mãos, passei a Regresso a Reims sem mais demoras, até porque o livro de Didier Eribon é também uma história como as da ficção, a de um rapaz que nasceu num meio extremamente pobre e bruto e sai de casa assim que pode (até porque é homossexual e o pai e os amigos deploram pessoas como ele), não regressando senão muitos anos depois, quando já a mãe está sozinha e a relação com ela finalmente se recupera. Esse regresso a Reims é realmente poderoso, porque Didier Eribon entende que não era afinal da homossexualidade que teve vergonha (já escreveu sobre este assunto noutro ensaio que foi, aliás, libertador para muitos), mas das suas origens sociais. Colocando-se, assim, no centro da narrativa, ele analisa sociologicamente o tempo da sua infância e mesmo o tempo que antecedeu o seu nascimento (a vida tremenda de ambos os progenitores) para analisar as razões por que cresceram tanto os votos na Frente Nacional, incluindo no seio da sua família, que votara sempre no Partido Comunista. Elogiado por muitos, incluindo a falecida romancista Hilary Mantel, Regresso a Reims é um livro sobre as desigualdades de sempre e o que estas provocam no futuro.