Os intelectuais
Um dia, o escritor norte-americano Richard Zimler, que vive em Portugal há muitos anos, contou-me que quando chegou, ainda bastante novo, à Europa, sentiu que podia respirar fundo em muitos aspectos (a América do seu tempo era terrivelmente puritana e atrasada, apesar de Woodstock e outras modernices); e que, entre outras coisas, no Velho Continente chamar intelectual a alguém era, de certa forma, um elogio, enquanto nos EUA funcionava (e funciona) quase como um insulto (alguém que só pensa e não faz nada? bah). Lembrei-me disto a propósito de um encontro a que fui recentemente em São Miguel e que celebrava o Centenário da Visita dos Intelectuais (a viagem de uma série de personalidades do Continente que foram visitar as ilhas em 1924, supostamente para as elogiarem no regresso em livros e artigos e conseguirem para o arquipélago uma atenção que ele infelizmente não tinha); mas desta história, que tem muitos pontos que vale a pena desenvolver, falarei mais tarde, com tempo; o que hoje me inquieta é saber que, cem anos depois, lá como cá, sempre que os políticos precisam, os intelectuais são chamados a reuniões para darem opiniões num disfarçado ou descarado pedido de apoio; mas depois, quando se ganham eleições e se constituem governos locais ou nacionais, a Cultura fica geralmente para trás, mal servida de dinheiros e sem ver quase nada dos seus projectos realizados. Coisas que não mudam num século e que se calhar não mudarão.