Paris, não sejas inglesa
A França é um dos países que mais a sério se levam – e que levam a cultura mais a sério. Os membros da Académie Française chamam-se nada mais, nada menos do que «Imortais» e defendem com unhas e dentes a língua de Molière; de tal modo que há uns tempos condenaram publicamente o uso de anglicismos, chumbando, irritados, a palavra «flyer» (que também aqui usamos vulgarmente para dizer «desdobrável»), a expressão «asap» (abreviatura de «as soon as possible», que consideram tudo menos transparente e sem qualquer vantagem em relação a «dès que possible») e o afrancesamento de verbos a partir de palavras inglesas, como, por exemplo, «scorer», que se emprega aparentemente com regularidade no desporto (do inglês «score», marcar pontos). Mas é curiosamente quando a imprensa francesa mais se assemelha aos tablóides ingleses e americanos no desmascarar da vida privada do Presidente que isto acontece. Porque, se a história de Mitterrand e de uma filha ilegítima perfilhada apenas aos dez anos fez as parangonas dos jornais franceses na época do escândalo, houve um longo hiato até as revistas voltarem às histórias pessoais dos seus dirigentes – e fizeram-no com Sarkozy, que se pôs a jeito, mas mesmo então não usaram da agressividade que parecem agora dirigir a Hollande, acusado, entre outras coisas, de manter várias concubinas, uma das quais instalada no Eliseu num luxo pago pelos contribuintes (só porque não se casou, não quer dizer que essa senhora não seja a mulher dele). Enfim, os Imortais zangam-se com a língua inglesa, mas os simples mortais parecem adoptar alguns hábitos dos países anglófonos sem nenhum problema.
P.S. Escrevi este post antes de saber que ia haver separação.