Passarinhar
Como há uns tempos os Extraordinários se divertiram com um texto que aqui publiquei sobre «vegetarianismo linguístico», resolvi voltar à carga e dizer que, para evitar os males da carne vermelha, sempre podemos recorrer às aves e fazer, na mesma, um brilharete lexical. Senão, vejamos: No galinheiro de um estádio de futebol, pode ser triste um adepto ver perder a sua equipa por causa de um frango – é, na verdade, um galo se isso acontecer e até o pode deixar com pele de galinha; pior ainda é se, à saída, está a chover e chega a casa um pinto. Se assim for, mais vale à mulher, que é uma gralha, calar o bico (antes que ele lhe corte o pio), comer como um pisco e a correr a sopa a ferver (o que vale é que tem goela de pato) e ir deitar-se com as galinhas para evitar discussões (já tem penas que cheguem). O seu vizinho, um pato-bravo da habitação clandestina, casado com uma perua de nariz aquilino com a mania das grandezas, queria multiplicar a fortuna, acreditou na galinha dos ovos de ouro (foi um pato), contou com o ovo no cu da galinha, mas o negócio trazia água no bico e, afinal, acabou depenado (mais valia um pássaro na mão, disse-lhe a mãe, uma pata-choca com pés de galinha debaixo dos olhos). Por sua vez, o sobrinho, um borracho que tinha o hábito de se pavonear por aí, verdadeiro galifão, pôs-se a galar a pombinha do andar de cima, que era o patinho-feio do prédio, papagueou-lhe uns poemas de amor, ela derreteu-se, caiu que nem um patinho, mostrou-lhe a passarinha (no Norte seria o pito) e agora vem aí a cegonha – e tomara que a rapariga seja uma mãe-coruja, porque o rapaz é um galo doido, capaz de a trocar por uma pega à primeira oportunidade (estes galarotes deviam era morrer como tordos, comentou a mãe da desonrada). Gostaram? Estou a tornar-me uma ave rara, mas escarafunchar nos dicionários é ou é não o ovo de Colombo?