Pobres autores
Estou cada vez mais convencida de que o consumidor final é a única coisa em que hoje se pensa quando se produz um artigo; e, se até há alguns anos a cultura era excepção, pois tudo mudou. Muita gente já não sabe quem escreveu o livro que anda a ler, o que é verdadeiramente triste (embora fosse pior se o livro não chegasse a ser lido), e os autores (seja em que área for) estão relegados claramente para segundo plano. Num anúncio de página inteira do Público do dia 29 de Setembro último, publicitava-se um filme em DVD que vai ser vendido com o jornal a partir do próximo dia 9. Encabeçava a página a frase melosa «A mais bela história de amor...» (com reticências e tudo); e, sobre a fotografia de duas lindíssimas jovens de olhos fechados no momento pré-beijo ardente (as actrizes, bem entendido: uma loura, a outra morena), um texto em duas colunas resumia o enredo desta «história de amor avassaladora» (o adjectivo é sempre o mesmo) e, ao lado, elencava os prémios que o filme ganhou ou para os quais foi nomeado (e são uns quantos). Na base da página, o título Retrato da Rapariga em Chamas, a data a que o DVD estará à venda e o preço (9,99 € com o jornal). Mas... De quem é o filme, alguém me diz? Não. Numa foto minúscula da capa do DVD a um cantinho, o realizador não é sequer legível. Se os autores, que são os responsáveis pela criação artística, já não têm uma linha para eles num anúncio de pagina inteira... Adeus, futuro