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Horas Extraordinárias

As horas que passamos a ler.

23
Abr21

Rasgos

Maria do Rosário Pedreira

Voltei a ser cronista, desta feita no jornal Mensagem. Quinzenalmente, recordo a Lisboa da minha infância e falo do que me faz saudades, baseando-me em histórias de família, muitas delas relacionadas com a minha mãe (talvez seja por isso que lhes pus o título genérico «Cidade-Mãe»). Gosto muito de crónicas, também como leitora, e na minha geração não posso deixar de mencionar as crónicas diárias de Eduardo prado Coelho no Público, cultas e leves ao mesmo tempo, e as semanais e modernas que celebrizaram Miguel Esteves Cardoso n'O Independente. Ele hoje escreve diariamente uma língua no Público, o que torna mais difícil manter aquele seu estilo de página inteira, mas às vezes ainda é tão bom como antigamente; um dia destes, elogiando o Diário de Lisboa, por exemplo, teve um desses rasgos e escreveu: «Se tirássemos o Diário de Lisboa do fio da história do jornalismo em Portugal, desmanchava-se a manta toda e ficávamos com os joelhos a bater nos cotovelos [...]» São frases assim que às vezes fazem a beleza de uma crónica e nos arrastam ao longo do texto. Ainda hoje temos cronistas muito bons (o escritor Afonso Reis Cabral está a começar mas já promete muito, assim como a escritora e crítica Ana Bárbara Pedrosa, cujo humor é impagável), e o nosso MEC é só um deles.

6 comentários

  • Eu sei que esteve, sim, e que aquela pergunta foi sua. Pela parte que me toca, não creio que as minhas «acções» e «omissões» sejam responsáveis pelo tal «mundo cão». É mesmo uma coisa dos tempos em todo o mundo e o que faço na maioria das vezes é lutar contra isso. Não percebi por isso o seu comentário. Bom Dia do Livro!
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    Pedro Sande 23.04.2021

    Cara Maria do Rosário: se o faz, faz bem. Mas terão o mesmo entendimento, não editoras como a Maria do Rosário, casas editoriais monopolistas como a Leya ou a Porto? Para a percepção do meu comentário e com sua autorização - a casa é sua - passo a explicar: Num debate promovido pela casa Fernando Pessoa sobre «como chegaram os livros a quem os lê neste confinamento» — onde participou a Maria do Rosário Pedreira, aparentando vestir mais o seu fato de editora (ou leitora profissional, como se assume) do que de poeta e escritora, foi lançada a seguinte pergunta. «Qual o lugar dos independentes na literatura portuguesa actual?»
    A resposta da Rosário pode resumir-se no seguinte, começando pela sua afirmação — denotando aparentemente alguma inevitabilidade e conformismo (realismo? sem dúvida!): «Vivemos num mundo muito cão, sendo cada vez mais difícil publicar um livro por falta de distribuição alargada. Não conseguirá o independente (obviamente, das editoras) entrar nas grandes cadeias, se esse independente for um escritor que se auto-publica. Nunca sendo criticado ou recenseado (não será o público o melhor crítico do escritor?) tem pois um papel (desafio?) muito difícil. Só conseguirá afirmar-se como escritor se tiver tempo e disponibilidade para se auto-impor, através das bibliotecas ou idealizando programas que o aproximem do público. De outro modo ficará na ignorância do mesmo. A menos que tenha a «sorte?!» de um académico (?) que fale dele. O escritor independente só se pode afirmar nas redes sociais. O comércio não está neste momento construído a pensar nesses objectos únicos, sozinhos (verdadeiramente livres?) que não vêm de uma distribuidora. É o mundo em que vivemos. Não há volta a dar». E, sugere aos criativos independentes: «tentarem concorrer a prémios, forma de chegar o livro aos principais pontos de venda, pois são as editoras que os mandam (promovem?!) aos críticos e jornais. Finaliza a Rosário, pessimista: «Não tenho ideia que se possa fazer grande coisa mais», chegando a afirmar «não ter dúvidas de haver muito boa literatura que fica nas gavetas», mesmo se, num aparente regresso a uma constatação de certo modo dúbia, afirme que é cada vez mais difícil encontrar (nos jovens?) qualidade.
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    Pedro Sande 23.04.2021

    Nas redes sociais, mas de forma mais abrangente, também António Carlos Cortez se queixa da actual perda do livro, focando-se muito na perda das humanidades, no panorama de um mundo novo carregado de novas fórmulas e novas “entidades” como o digital.
    Também José Couto Nogueira a um convite para participar numa edição auto-editada colectiva, de “Autor para Leitor”, afirmou, declinando: o “mercado” não vê com bons olhos a auto-edição. Pudera!
    A análise destas duas “preocupações” — sobre o tal novo mundo para que caminhamos, necessariamente diferente do passado — exige pois que se aborde esta temática de uma forma cada vez mais abrangente, mas visualizada sobre os diferentes actores. Neste mundo tão fechado e claustrofóbico em que se colocou o livro — como tantas outras actividades humanas — neste mercado de oferta e procura cada vez mais desequilibrado, monopolizado por poucos, “mercadejado”, não haverá necessidade de uma abordagem através de fórmulas novas, não repetindo à exaustão aquilo que aparentemente não faz efeito ou traz nada de novo? Não haverá por parte das casas editorais, as maiores sequestrando o mercado, a distribuição, o gosto, transportando tantas vezes um “petit” cinismo muito próprio do «é a vida!» — verdade, mas apenas a sua!, confundindo esse sequestro com falta de qualidade — uma responsabilidade particular na não transposição de novas fórmulas, na procura e assumpção de uma literatura nova, diversa, na não "dação" ao leitor de objectos literários senão os constantes, usuais, os marcados pelo passado? Na transformação, pois, da literatura em mercado? No "mercadejar" incessante do livro, consagrando a este «mundo cão», tão diferente da substância essencial da literatura, a liberdade e diversidade criativa só sujeita ao verdadeiro grande inquisidor… O Leitor final!
    Não pode, pois, o mercado, continuar a afirmar a decadência do livro e da leitura (será real essa decadência ou apenas uma alteração e uma análise centrada e focada nos actores usuais?) sendo incapaz de novas fórmulas e novas relações baseadas na liberdade, universalidade e diversidade do objecto e não no mercantilismo puro. Será que o livro — como bem pergunta António Luiz Pacheco —, chega aos leitores sem chegar às pessoas? No mundo do livro — à imagem de outros mundos — a existência de entorses e problemas só se arrasta se nenhum de nós for capaz — como sujeitos e actores activos — de dar passos noutro sentido. E mantivermos uma atitude passiva. Tornando-nos tantas vezes cúmplices por comodismo, omissão, passividade, assumpção de inevitabilidade.
    Por mim, declino esses papéis!
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    Artur 23.04.2021

    Estão estas temáticas tão bem explicadas e ilustradas no livro do João Tordo "Manual de Sobrevivência de um Escritor" ! A realidade é dura e não vale a pena culpar os editores. O sucesso de um escritor no mercado é muitas vezes um mistério. Pessoa só viu publicado em vida o seu "Mensagem" que hoje é, injustamente, menosprezado relativamente ao "Livro do Desassossego" ou à poesia de Álvaro de Campos. O mercado foi-lhe injusto em vida, mas vingou-o postumamente. Para bem de Pessoa, oxalá haja vida depois da morte.
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    Pedro Sande 23.04.2021

    Caro Artur. Mas há mistérios que são decifráveis. Desde que me dediquei à investigação que sei que uma análise cuidada "documental", de um corpus complexo como é o social, traz sempre ao de cima recorrências, regularidades. Aquilo que se procura não é um ajuste com as "estórias", mas a compreensão da realidade e a afirmação da verdade e das coisas "intransparentes" no seu devido tempo.
    A história da literatura está cheia de casos de autores da espuma dos tempos, desaparecidos no tempo e espaço e vice-versa. Agora como historiador — numa outra vida como economista, naquilo que é apenas outra visão do social —, sei bem dos processos de uma realidade social complexa. Mas como escritor independente e associado da APE — dou-me de facto mal com a proletarização e assalariamento dos autores — sei também da minha responsabilidade para com a denúncia daquilo que penso incorrecto e que está nas nossas mãos pelo menos tentar alterar. A capacidade de reflexão do escritor serve, para mim, acima de tudo, para exercitar a consciência do bem comum, afastando os tantos males e entorses criados por uma construção humana: o mercado. O Homem não pode, nem deve ser visto apenas como uma mercadoria, como um traficante de interesses, a economia devendo ser apenas um instrumento para a resolução do social; e, muito menos usada como açambarcamento.
    Artur: o sucesso de um escritor no mercado do livro — cada vez menos lugar literário — passa em primeira instância por contrariar uma visão monopolista do mesmo e em assumirmos que há muita qualidade fora do "mainstream". E que a escolha que se faz de muitos eleitos na edição não tem que ver exclusivamente com qualidade, mas com razões muitas vezes sobrelevando de outras condições. Nada diferente do "mercado político"! Assuma-se estes postulados, a diferença, o confronto de opiniões. Assuma-se, também, que o profissionalismo da edição não significa muito mais do que um gosto pessoal, não o deixando enquistar — o excesso de leitura também distorce. Não colocando como inabilitados todos os que por opção pessoal, gosto ou excesso supranumerário se vêem de fora da opção editorial. De modo a não fazer passar a mensagem que a qualidade reside apenas nos "eleitos" e não que a opção pela edição é cada vez mais um poder editorial vergado por uma difusa análise de marketing.
    Colocar a literatura nas mãos do mercado é não possibilitar aos leitores de outras "escritas", muitas vezes mais cheias de substância do que muita da literatura leve, cor-de-rosa e recorrente, que quer ser cânone.
    Exija-se ao Estado, àquele que deve defender o bem comum que, a bem do leitor e do seu direito à diversidade, intervenha e corrija estas imperfeições do mercado livreiro; e, faça-se outra coisa: assuma-se que o confronto de opiniões não significa cavar trincheiras, mas um levantar de problemas concretos com vista ao estancar da perda pronunciada de leitores, que pode ter todos os motivos do mundo, até opções editorais erradas.
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