Relíquias
Uma das razões por que é um verdadeiro prazer ler Mário Cláudio – já aqui o disse – prende-se com o número de palavras que aprendo ou reaprendo a cada nova obra que publico. Nunca me esquecerei, por exemplo, daquele «bazulaque» que encontrei em Tiago Veiga e que quer dizer, entre outras coisas, «gordo»; ou do «plumitivo» que havia muito não via escrito em lado nenhum, talvez porque as «plumas» e «penas» com que dantes se escrevia tenham sido substituídas por meras teclas com caracteres desenhados. Um dia destes, aliás, descobri com saudade que imensas palavras que ouvia em adolescente se evaporaram do discurso contemporâneo e correm o risco de se ver para sempre sepultadas, desconhecidas que são dos nossos jovens com trinta anos (sei do que falo), por mais engraçadas, sugestivas e vivas que sejam. Falo, por exemplo, de «amásia», forma evidentemente insultuosa de nomear a concubina de alguém (sobretudo de um homem casado), de «lambisgóia», «serigaita» ou «pespineta» (em pequena, a minha avó usava este termo muitas vezes), palavras que têm um mundo inteiro lá dentro, cheias de cores e formas, e dizem mesmo aquilo que queremos dizer quando pensamos em alguém. E, por isso, resolvi que, uma vez por mês, vou recuperar aqui no blogue uma dessas deliciosas relíquias, pedindo aos extraordinários que as usem por aí, não vão desaparecer sem deixar rasto. A última de hoje é «pindérico», substituída pelo actual «piroso», vocábulo que não tem, convenhamos, a mínima piada.