Salvam-se os poetas
2020, já aqui o disse, foi um ano péssimo. Mas, até nos anos excepcionalmente maus, há coisas boas. A poesia teve em 2020 um ano bom. Além de a contemplada com o Prémio Nobel da Literatura ter sido uma poetisa (Louise Glück, com vários livros no prelo em Portugal para nos deliciarmos em 2021 com a sua voz), a minha sobrinha Rita, de 17 anos, escreveu poemas bons e bonitos. Quatro amigos poetas foram premiados: Ana Luísa Amaral venceu o Prémio Leteo em Espanha, atribuído por livreiros à sua obra What’s in a Name?, e por cá o Prémio Vergílio Ferreira; Luís Filipe Castro Mendes arrecadou o Grande Prémio de Poesia APE/CA com os seus Poemas Reunidos; António Carlos Cortez levou o Teixeira de Pascoaes com Jaguar; e João Luís Barreto Guimarães um galardão que homenageia um confrade, o Prémio Armando Silva Carvalho, com o seu livro Nómada. Adília Lopes publicou Dias e Dias (que fala da experiência do confinamento), José Carlos Barros publicou dois livros (A Educação das Crianças e o curioso Estação com os poemas que publicara no DN Jovem) e até regressou das brumas, tal um D. Sebastião, Paulo Teixeira, de quem já tinha saudades, com o livro A Comoção do Mundo. Saiu a Poesia Grega traduzida por Frederico Lourenço e o segundo volume da Obra Poética de António Ramos Rosa. Carlos Oliveira Santos não só comentou um post deste blogue com muitos anos em Dezembro passado (Poetas não publicados), confessando ser ele o autor de um poema de que eu lá falava, como me enviou o seu volume de Poemas Escoceses que responde pelo título principal Aye Aye Aye (falarei dele mais tarde aqui no blogue). Descobri que Vítor Gameiro Pais, marido de uma prima de quem nada sabia há uns trinta anos, era poeta e publicara o livro Filhos do Betão e do Aço, de que reproduzo abaixo um belo poema. Eu própria, que já não publicava nada há anos, juntei uns textos antigos e fiz outros novos sobre uma viagem a Macau para uma miniatura de vinte e poucas páginas publicada pela Nova Mymosa a que dei o título Estampas Chinesas. E houve mais, claro, mas não posso ser exaustiva. Num ano tão prosaico, pelo menos de falta de poesia não nos pudemos queixar.
Boletim meteorológico
O boletim meteorológico previu o mesmo
que na palma da mão já me tinha sido lido:
chuva, mau tempo, desassossego, vento forte,
nevoeiro, má sorte.
Sangrem as nuvens, revolvam-se as ondas,
agitem-se vendavais no meu caminho.
Que me importa?
Tenho um gorro, um impermeável,
um guarda-chuva
e um calo na linha da vida.