Um novo Tabucchi antigo
Sai dentro de dias para os escaparates um livro maravilhoso de Tabucchi que, sendo o seu segundo romance, nunca tinha sido publicado em Portugal. A partir de objectos de família legados de geração em geração e encontrados no sótão da casa paterna, o Capitão Sexto torna-se historiador da sua família. Do primeiro antepassado toscano, nos anos 1850, até ao seu próprio nascimento, reinventa a vida dos antepassados e, através de personagens delirantes (como as duas gémeas grávidas que só têm um filho, a tia-mexilhão, o padrasto que obriga a mulher a comer pescadinhas a toda a hora ou o rapaz que decide não abrir a boca no colégio interno e se desabitua simplesmente de falar), deixa-nos assistir às tribulações de diferentes Sextos através de episódios que contam, afinal, a história da Itália no século XX: a unificação do país, as duas guerras mundiais, o fascismo e os anos da contestação comunista. Este romance incrivelmente imaginativo de um jovem Tabucchi ainda em busca da sua voz literária, combina projecções imaginárias e realidades políticas para nos dar a ler uma narrativa barroca com laivos de lenda que faz brilhar os recursos da ficção. Pouco conhecido do público, O Pequeno Navio conquista os leitores, garanto, desde as primeiras páginas. Não percam. A tradução é de Maria da Piedade Ferreira e foi revista por Maria José de Lancastre, autora da Fotobiografia de Pessoa e viúva do romancista italiano.