Uma Lolita moderna
Publico este mês o segundo romance da autoria de Marieke Lucas Rijneveld (dos Países Baixos), que viu o seu livro de estreia, O Desassossego da Noite, premiado com o Man Booker International Prize, o que é uma façanha, sobretudo se tivermos em conta que se trata de alguém extremamente jovem e que sempre morou longe dos grandes centros pensantes, numa quinta onde se criavam vacas. E à segunda arremetida não só não desilude como se mostra capaz de reinterpretar a Lolita de Nabokov. Minha Querida Favorita, assim se chama a nova obra, é a história de um verão asfixiante em que um veterinário rural se aproxima da filha adolescente do criador de gado para quem trabalha. Apesar de correrem boatos de uma doença que afecta seriamente os bovinos das redondezas, o veterinário só pensa em fugir aos traumas da infância e a um casamento que secou para se dedicar de corpo e alma à «sua querida favorita» que, sozinha na quinta nessas férias, prefere viver num mundo de fantasia a ter de aceitar o abandono da mãe. Nesse verão, os dois desenvolvem um fascínio tão obsessivo um pelo outro que chegam a cruzar todas as fronteiras concebíveis. E a confissão opressiva presente nestas páginas é uma história comovente e ao mesmo tempo chocante sobre o amor proibido, a solidão e a identidade. Como diz o crítico Jeroen Maris, «não é uma festa agradável, não senhor. Mas o leitor deseja estar na lista de convidados, pois de contrário perde uma grande, grande obra literária.» Cuidado com os estômagos sensíveis. A tradução é de Maria Leonor Raven e a capa de Rui Garrido.