Viver com arte
Publiquei um livro há muitos anos sobre as máfias que roubam obras de arte (vasos gregos, bocados de templos romanos, portões e candeeiros art déco, azulejos, pinturas renascentistas...) e as substituem por cópias perfeitas para vender os originais a museus que com eles pactuam ou milionários russos daqueles que têm sempre capangas a protegê-los. Muitas vezes, infelizmente, a coisa corre mal; e, no caso de um Picasso roubado e escondido logo a seguir numa lata do lixo, o ladrão foi caçado e, quando informou onde estava o tesouro, já ele tinha sido esmigalhado no camião... Imagino frequentemente quem terá na sua sala aqueles quadros lindos de Vermeer que foram roubados em São Francisco e lembro o albanês do romance Os Dez Livros de Santiago Boccanegra, de Pedro Marta Santos, finalista do Prémio LeYa, que tinha um Rothko na sua sala mas não o podia mostrar a ninguém... E falo disto porque vejo que uma americana que foi a Roma aos dezasseis anos, e atirou a moedinha à Fontana di Trevi exprimindo o desejo de ali voltar, acabou por se casar décadas depois com um príncipe romano e vive numa casa com uma escada em espiral desenhada pelo arquitecto da Basílica de S. Pedro, uma escultura de Miguel Ângelo no Jardim e um tecto pintado por... Caravaggio! Mas agora o príncipe morreu e os herdeiros exigem que se venda a mansão por um valor tão disparatado que vai ser difícil encontrar quem a compre. No entanto, se a casa for efectivamente vendida, nem consigo pensar no que será o choque de deixar de poder viver com tanta arte...